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Date:28 jun., 2015

Saint Michel, a morada de um arcanjo

A abadia de Saint Michel recortada contra um crespúsculo rosado já fez muita gente sonhar no mundo todo.

 

 Por Liane Alves

 

É certamente a abadia mais linda do mundo, totalmente incrustrada sobre rochas escuras no meio do mar prateado da costa da Normandia, na França. E se um dia Saint Michel foi promontório ligado ao continente, hoje é apenas ilha, com 53 moradores fixos, seis monges e, quem sabe, um arcanjo.

 

A 178 metros de altura, no alto de uma torre pontiaguda, um anjo de asas douradas protege a França. Reis, papas, nobres e milhões de peregrinos já vieram prestar ali sua homenagem ao anjo dos anjos. O nome hebraico Michael dá a suprema qualificação do arcanjo: Aquele que é como Deus. Portanto, a casa terrestre desse ser angélico tão elevado deveria ser magnífica. É exatamente o que a abadia de Saint Michel é.

 

E quem já não ficou fascinado com a foto da abadia contra um róseo crepúsculo de verão? Saint Michel é a mais fotogênica de todas as igrejas e encanta milhões de pessoas em todo o mundo. E eu sou uma delas.  Desde quando eu vi a silhueta de Saint Michel pela primeira vez numa página de revista aos nove anos de idade, eu quis ardentemente visitá-la. Foi a beleza da igreja que me despertou para a história de Miguel e suas batalhas contra o arquétipo do mal, Satã. Graças à arquitetura celestial da abadia, nasceu em minha alma uma conexão natural com o arcanjo.

 

Estive, várias vezes, muito perto de concretizar o sonho de visitar Saint Michel: eu morei na França e eu viajei para regiões muito próximas. Em algumas ocasiões, a abadia quase esteve ao alcance da minha mão. Mas tornou-se óbvio para mim que só se podia chegar a esse lugar por alguma espécie de merecimento, e parecia que eu não o tinha. Costumava me consolar dizendo que quando eu conseguisse chegar lá, seria um evento memorável, daqueles inequecíveis. Portanto, foi com o coração aos pulos que finalmente eu iria colocar meus pés em Saint Michel. Um sonho infantil estava prestes a se realizar. Eu mal suportava a emoção.  

 

Nos cumes das montanhas

Nessa altura da vida, eu já havia visitado outras igrejas dedicadas ao arcanjo, como a Sacra di San Michele, um conjunto arquitetônico erguido no ano 1000 perto de Turim, na Itália. Lá, eu bebi da sua fonte milagrosa e fiquei maravilhada com a clara igreja no alto de uma montanha. Eu já sabia que o arcanjo tinha especial predileção pelas alturas: as construções dedicadas à ele geralmente são em lugares altos e isolados. Ele teria aparecido pela primeira vez na Terra em outro monte, o Gárgano, na região da Puglia, na Itália, no século V. A bela Saint-Michel-l´Aiguille, no sul da França, no alto de uma montanha de pedra em forma de agulha, e o imponente monastério de St. Michael´s Mount, edificado numa ilha na costa da Cornualha, também se erguem em homenagem ao Príncipe Celestial. Porém a abadia de Saint Michel era a abadia de Saint Michel. Hors concours. Não dava para comparar.

 

Partindo de Paris e até chegar a abadia, eu passei por diversas estradas vicinais com macieiras em flor e casas com arquitetura de enxaimel, muito características da região normanda. As distâncias entre as cidades na França, um país com o tamanho aproximado de Minas Gerais, no Brasil, ou California e Nevada juntos, nos Estados Unidos, são muito pequenas aos nossos olhos. Saint Michel, no noroeste do país, está a apenas 284 km da capital francesa e pode ser conhecida numa viagem de um único dia. Mas eu preferi chegar à noite e ficar num hotel quase em frente a ilha para reservar o dia seguinte para percorrê-la com calma. Assim eu pude degustar no jantar os três queijos mais famosos da região, a trindade sagrada – Camembert, Pont l´Evêque e Livarot — e dormir embalada com o calvados, a aguardente de maçã típica de lá. Sem trocadilhos, eu dormi como um anjo. De manhã, duas jornalistas e um representante da Atout France e eu chegamos à ilha. E às surpresas que nos aguardavam.

 

Templários à vista

A primeira visão que temos de Saint Michel é nada menos que magnífica. Num dia nublado – como são quase todos na Normandia – a abadia se ergue como uma ostra agarrada num rocha. Era impossível se distinguir direito onde começava a construção e onde terminava o relevo da ilha. O conjunto arquitetônico me parecia um pouco menor do que eu esperava, mas já podia ser avistado desde longe. Conforme nos aproximávamos, o impacto aumentava.  

 

O vilarejo aos pés da colina-ilha nos faz lembrar que a abadia é, antes de tudo, uma fortaleza medieval. É completamente cercado de muralhas e nós temos de atravessar uma pequena ponte para atingir o seu portão principal. Pouco acima da viela repleta de turistas e de lojas, Père André espera por nós. Ele é o monge responsável pela abadia e pela enorme dor de cabeça que é administrar a visita de seis milhões de peregrinos por ano. Père André vive há trinta anos ali. Ele tem o rosto rosado de uma criança, olhos muito azuis e veste um agasalho azul escuro com uma cruz simples de madeira no peito. É dito que nem sempre Père André está de bom humor, mas naquele momento ele estava muito contente: com alegria ele subiria as centenas de degraus que conduzem à abadia para mostrar a grande paixão da vida dele para um grupo de jornalistas. “Saint Michel merece toda a divulgação do mundo”, diz o religioso segurando o fôlego por subir tão rapidamente os degraus. Segundo ele, quanto mais pessoas puderem vir à abadia e, principalmente, se conectar com a força do arcanjo, melhor. “O mundo vai precisar disso”, afirma o monge, preocupado com os tempos futuros.

 

Père André pertence à Fraternidade Monástica de Jerusalém, instituição religiosa recente. Com esse nome, imagino se a fraternidade não poderia homenagear os antigos servidores do Templo na Terra Santa, isto é, os cavaleiros templários. Presto atenção nesse detalhe porque onde a influência templária se faz presente na França, é possível se presumir muitas coisas. Por exemplo, a presença de um altar dedicado à Notre Dame-sous-Terre, a virgem ctônica do cristianismo, característica dos locais sagrados ligados a eles. A devoção ao arcanjo, um guerreiro, também falava muito de perto ao coração dos antigos cavaleiros responsáveis pela guarda do Templo de Jerusalém. Mas a equação Saint Michel e templários não é algo tão evidente assim – historicamente, a abadia não é vista como resultado de sua presença em território francês, pois as igrejas ligadas à ordem deles se proliferavam pelo sul da França, e não ao Norte. Embora exista a lenda local de que nos alicerces da abadia foram enterradas as pedras verdes (ou esmeraldas) com as quais teria sido esculpido o cálice do Graal, de quem os templários eram os guardiões, não havia mais nenhuma evidência maior dessa relação. Mesmo assim, eu intuí que havia algo a mais nessa simples visita turística. E não estava enganada. Começava agora a viagem que havia prometido para mim toda minha vida.

 

A energia de Michael

Michael, dentro da angeologia judaica, islâmica e cristã, defende e protege os seres humanos contra o mal. É o guerreiro de Deus, o chefe das hostes angelicais, o príncipe de Israel. Para estudiosos do assunto, ele também é Metraton, o maior dos seres criados por Deus. Para outros, é o próprio Jesus, como afirmam alguns ramos evangélicos. Na Bíblia, é chamado de príncipe dos judeus. O autor português Vitor Manuel Adrião identifica como o ápice da Árvore da Vida, o Deus manifestado, contraparte masculina de Shekinah, o aspecto feminino de Deus.

 

Père André, porém, prefere começar a falar dos curiosos aspectos históricos da abadia enquanto subimos o vilarejo que mantém a arquitetura medieval em suas ruas estreitas. Passamos pela casa paroquial onde ele mora, e deixamos ali bolsas e mochilas mais pesadas a seu conselho (“Por que carregar tanto peso rumo ao alto?”, ele nos perguntou, dando ênfase no duplo sentido da frase). Vamos em direção à pequena igreja de São Miguel, mais recente e paroquial, do outro lado da rua. É uma edificação simples, com várias representações do arcanjo vencendo o demônio e missas celebradas a cada hora. Nós ainda estamos no sopé do vilarejo.

 

O pequeno vilarejo aos pés da Abadia é remanescente dos tempos medievais. Aléḿ de lojas, ali pode-se encontrar tavernas e restaurantes. Nos mais prestigiados, como no Pre Salé, é servido o carneiro naturalmente salgado, que bebe água salobra e come as ervas que nascem perto da ilha.

 

 

Se fosse possível abstrair mochilas, tênis e máquinas fotográficas dos turistas que enxameiam por ali, seria possível vê-los como os antigos peregrinos que chegavam à abadia à procura de uma benção. No ano mil, eles vestiam roupas multicoloridas, traziam instrumentos musicais e os mais abastados ostentavam uma fileira de conchas de prata no peito, o símbolo dos peregrinos. Eles chegavam ali aos milhares, especialmente durante Idade Média. Houve dias tão concorridos que muitos deles chegaram a ser pisoteados e mortos em dias de grandes festas. Hoje, são turistas do mundo inteiro que passam por ali nas lojinhas de suvenires onde existiam casas e tabernas. Père André aconselha a subir os degraus rumo à igreja em ziguezague, para que não nos cansemos muito.

 

A visão da fortaleza vista de baixo é impressionante: um maciço de pedra equivalente a um prédio de 20 andares. Chegamos todos arquejantes aos pés da construção monumental, que foi feita em várias etapas da história. É uma fortaleza inexpugnável, num local altamente estratégico – de frente para a Inglaterra que ficava do outro lado do oceano e que tinha o péssimo hábito de sempre querer invadir a região. A Normandia, inclusive, foi liderada no século XII por Eleonor de Aquitânia, a mulher mais sagaz, culta e poderosa de toda a Idade Média. Duquesa, e depois rainha consorte da França e da Inglaterra, foi também mãe de um corajoso rei, Ricardo Coração de Leão. As histórias dos antigos reinos medievais e suas batalhas começam a invadir minha mente. Era evidente que consagrar uma abadia a São Miguel Arcanjo em lugar militarmente tão importante poderia ter tido razões estratégicas. Mas será que era só isso?

 

Vestígios da História

A abadia-fortaleza também defendia a Normandia dos bretões, o povo vizinho. Seja como for, a igreja e seu monastério permaneceram inexpugnáveis durante séculos contra os guerreiros ingleses e bretões. Foi um célebre centro de peregrinações durante quase 400 anos mas, a partir de 1472, parte do seu conjunto arquitetônico se transformou em uma lúgubre prisão. Muitos presos políticos famosos morreram atrás de suas paredes de pedra. Durante a Revolução Francesa, a abadia foi terrivelmente depredada — os revoltosos a consideravam símbolo da opressão clerical sobre o povo e foram para lá munidos de picaretas. Ainda é possível ver essas marcas nos baixos relevos do claustro, onde anjos e santos foram expulsos a marteladas. Permaneceram intactos, porém, os frisos com flores, frutas e vinhas, para mostrar, absurdamente, que sua ira não era pessoal contra a construção em si.

 

No século XIX, Saint Michel volta a ser um centro de fé e devoção, sob a influência dos beneditinos. Mas poucos se arriscam a ir até lá. Os peregrinos lamentavam, consternados, o seu estado deplorável, e o risco de assaltos que ameaçava a quem ousa visitá-la. No final daquele século começa um intenso trabalho de recuperação. Uma comunidade de beneditinos se instala por ali e depois, a Fraternidade de Jerusalém. Hoje, é possível fazer retiros junto aos monges, acompanhando suas duras condições de vida. Por incrível que pareça, há filas de interessados, especialmente nos meses de verão, porque ninguém é bobo de ficar alguns dias em Saint Michel no meio do seu rigoroso inverno.  

 

Luxo e miséria

A abadia reflete a própria divisão social da Idade Média. Embaixo eram recebidos os peregrinos do povo, em grandes salões quase sem mobilia. No andar médio, ricamente decorado com tapetes, quadros e esculturas, eram recebidos reis e nobres. Em cima, no claustro, ficavam os monges, aqueles que eram considerados como os mais próximos a Deus. E, ao seu lado, a igreja, uma construção de estilo gótico que sofreu grandes incêndios (por causa da sua rica decoração interior, muito inflamável.

 

O interior da abadia é de beleza impactante. Todas as formas arquitetônicas do estilo gótico apontam para o céu.

 

O complexo de Saint Michel levou quase mil anos para ser terminado (a torre neogótica em forma de flecha, por exemplo, só foi instalada em 1888, e o imponente anjo dourado que a culmina, em 1897). Vários estilos convivem ali em harmonia e nas maquetes das salas iniciais do monastério é possível se acompanhar a evolução da construção original em suas diferentes etapas. Mas como teria começado a história da abadia de Saint Michel? E por que a igreja teria sido consagrada ao Arcanjo?

 

Aparição celeste

O lugar já era sagrado para povos antigos. Na costa ao redor do monte, menires e dolmens eram erguidos há quatro ou cinco mil anos. A ilha, com sua colina de 80 metros de altura, possivelmente era um lugar de cultos e celebrações celtas cerca de 500 anos antes de Cristo. Para Dol Gilles Déric, historiador canônico do século XVIII, o sopé do monte, nos seus primeiros tempos, abrigava uma comunidade de nove druidesas (sacerdotisas) que se dedicavam ao culto do deus Belenus (o “Brilhante’), o apolíneo deus celta da cura e do fogo.

 

Mas para conhecer com mais detalhes a história da construção dedicada ao arcanjo, vamos voltar ao ano de 708, na cidade de Avranches, vizinha ao monte Saint Michel. Lá vivia o abade Aubert, responsável por uma pequena comunidade de monges contemplativos. Ele era só um monge comum até ser assombrado pela resplandescente presença do arcanjo durante três sonhos consecutivos. O ser celeste ordenava a construção de uma igreja dedicada a ele no monte, exatamente no espaço circular pisoteado por um “novilho amarrado entre as árvores”. Esse espaço, ou cromlech, era o nome da construção circular atribuída aos velhos cultos dedicados ao deus-sol. E o cromlech era habitualmente demarcado por um novilho amarrado a uma árvore sagrada que ficava no centro do espaço consagrado ao deus. Uma hipótese sustentada por alguns estudiosos é a de que, em tempos remotos, pode ter ocorrido um sincretismo entre Michael e Belenus, ou mesmo entre o deus romano Mytra, também solar e brilhante, e o arcanjo.

 

Mas para Aubert a indicação tinha sido ordenada pelo príncipe dos príncipes, o arcanjo Michael. O próprio monge custou a se convencer disso. Diz a lenda que, desconfiado de suas visões, ele teria implorado ao arcanjo para dar um sinal de sua existência real. Ao ouvir isso, o ser celeste teria apontado seu crânio com um dedo e o perfurado, sem que no entanto Aubert morresse. Ainda hoje, em Avranches, é exposto um crânio com uma perfuração lateral descoberto em escavações no monte, e considerado como sendo o de São Aubert.

 

Da primeira construção feita pelo abade, supõe-se que nada restou. Mas duzentos anos após sua morte, descubro que foi erigida, talvez no mesmo lugar da anterior, a igreja românica de Notre Dame-sous-terre, redescoberta durante a reforma da abadia, e hoje interditada ao público por causa de suas diminutas dimensões e diante do pesado fluxo turístico local.

 

Como no catedral de Chartres, ali estava de novo um local associado à Virgem Escura subterrânea adorada pelos celtas e que fazia parte fundamental dos cultos dessa tradição pré-cristã. De acordo com outras teorias, a Madona Negra era também venerada pelos templários, que a identificavam com Maria Madalena, a Virgem Oculta, e protetora da sua ordem. Então poderia haver algo de diferente naquela pequena capela escondida que, na verdade, era o verdadeiro coração da abadia. Eu passei a percorer toda a impressionante construção arquitetônica de Saint Michel com o pensamento fixo na pequena construção de Notre Dame-sous-terre que estava parcialmente abaixo daquela arquitetura monumental. Père André andava pela abadia célere, passeando pela sua deslumbrante igreja gótica, pelos arcos do claustro, pelos enormes salões do scriptorium onde os monges pintavam as iluminuras com os dedos enregelados (duas enormes lareiras os protegiam do frio) e eu ainda permanecia intocada pela magia do lugar. Tudo era maravilhoso aos olhos, mas nada me atingia verdadeiramente o coração. Seria Saint Michel apenas uma concha sem nada dentro?

 

O coração do monte

Foi assim, de repente, que Père André nos desviou do fluxo dos turistas e abriu para nós um inesperado caminho atrás de um cordão vermelho que impedia a passagem dos visitantes. Seguimos seus passos rapidamente. Passamos por um vitral moderno do arcanjo e o religioso pede para aguardarmos ali. Não sabíamos de nada ainda, mas ele tinha se antecedido para poder acender as luzes da pequena capela de pedra de Notre Dame-sous-terre.

 

Nós entramos em silêncio. Os muros de pedra calcária sem nenhuma janela selavam o espaço. A energia contida ali era tão vigorosa que poderia ser cortada com uma faca. Impossível falar, impossível até continuar de pé. Uma das jornalistas solicita que Père André nos deixe alguns minutos em meditação, sentados em bancos simples de madeira. Na minha vida, até aquele momento, jamais havia provado tal sensação de paz. Poderia pedir aos céus nunca mais sair dali, diante de sentimento tão intenso, mas me contentei em desejar reencontrar aquela mesma paz no momento de minha morte. Foi o que consegui raciocinar naqueles instantes. Na verdade, rapidamente minha cabeça parou de pensar. Resolvi apenas permanecer unida com aquela energia sem precedente.

Por que um altar seria dedicado a uma parede? Histórias antigas contam que entre os muros dessa antiga cela monástica, o arcanjo apareceu em sonhos para o assustado monge Aubert. Seja como for, a paz que se sente na capela de Notre-Dame-sous-terre é inesquecível.

 Père André sorri satisfeito. Ele estava feliz em compartilhar aquele segredo. “Quando estou exausto, venho para cá. Em quinze minutos, estou novamente cheio de energia”, confessa. Eu acredito. É uma força sem explicação plausível, mas muito revigorante. Penso nas misteriosas pedras verdes colocadas na fundação da abadia. Seria o efeito de sua presença? Ou estaríamos em cima do cromlech celta onde foi edificada a primeira igreja? Pére André se aproxima de uma parede de pedra do lado direito da capela, mais antiga do que as outras, e profusamente iluminada. Muito estranho. Porque um altar seria consagrado a uma parede? Ela deveria ser muito importante para os monges que ergueram Notre Dame-sous-terre no século X. Segundo a lenda, esta seria uma parte da construção original que antecedeu a capela, restos de uma igreja, ou, quem sabe, da própria cela do monge Aubert. “Mas ninguém pode atestar isso com certeza”, acrescenta Père André, prudentemente. Talvez fosse exatamente ali que o arcanjo tenha aparecido   para o monge Aubert. 

 

Isso não importa. O que não se pode negar é a presença daquela energia poderosa, sentida e vivenciada por todos ali. Não tenho explicação para ela. Mas hoje tenho certeza de que em Saint Michel bate um pulsante e vivo coração.  

 

Despedidas

Saímos enlevados, mas pouco tempo depois caímos de novo na realidade. Vamos para a loja bem estruturada e ampla de Saint Michel. Lá são vendidos inumeráveis arcanjos dourados, réplicas da imagem que está no ponto mais alto da torre-agulha da abadia. São lindíssimas. Mas havíamos deixados nossas bolsas e mochilas embaixo, na casa paroquial – não podíamos comprá-las. Também não havia dinheiro ou cartões de crédito para adquirir as capas que imitavam a dos peregrinos, livros com cópias dos desenhos coloridos e delicados feitos pelos monges copistas ou conchas prateadas. Podia ser pura imaginação, mas pensei flagrar um sorriso de menino que acaba de pregar uma peça no rosto redondo de Père André. Mas para que queríamos comprar mais coisas, afinal? Já tínhamos recebido um presente extraordinário do arcanjo. Retribuo o sorriso do monge. Como esperava, mas não exatamente do jeito que tinha imaginado, a experiência em Saint Michel tinha se tornado um ponto referencial em minha vida. Só poderia agradecê-lo, com a minha mais profunda gratidão.

 

Os segredos da abadia

Nesse momento, os nossos viajantes devem estar se perguntando como poderão chegar à igreja de Notre Dame-sous-terre. Como nas lendas medievais, talvez seja preciso empreender uma aventura. Dela pode fazer parte, por exemplo, ficar algum tempo com os monges em retiro. Talvez assim, eles se sensibilizem e mostrem a capela, hoje formalmente interditada ao público. Ou talvez um pedido mais formal, em francês, possa comover Père André. O e-mail para informações sobre retiros é hotellerie@abbaye-montsaintmichel.com. Nada é garantido, mas não custar tentar.

 

Para saber mais:

 www.franceguide.com

 

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